segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

EMBAÇADAS AS FOLHAS

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NALDOVELHO

Tem janelas, tem portas, trincos, tramelas,
tem sala, tem quarto, cozinha e banheiro,
mobília discreta, ambiente sombrio,
parece uma casa, só não sei se é um lar.

Em cima da mesa, na sala de estar,
tem um vaso com flores
que não se permitem à essência.
Tem também outras plantas, violetas e avencas,
desmaiadas, sem viço, embaçadas as folhas.

Num canto imprensado, um telefone que chama...
É engano, é engano!

Tem estante, têm livros, todos eles fechados.
No quarto uma cama, que vive desfeita,
travesseiros amassados, lençóis amarelados,
a umidade ambiente é bem maior que aparenta.
Muita poeira e mofo, cortinas fechadas,
impedem que o ar possa se renovar.

Nessa casa mora um homem
que se entregou ao abandono,
que não pensa, não tenta e detesta poemas.
Música então, nem pensar!
Dorme muito e quando acorda pede para ir embora.
Já passou dos setenta, não quis ter nenhum filho,
não escreveu o seu livro, não plantou uma árvore,
e eu nem sei o seu nome, e nem como agüenta
viver assim dessa escolha, com medo que doa,
com medo de chorar.

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